Como o Daewoo Tico, um mini coreano usado, conquistou o mercado sul-americano de táxis

Você está cansado depois de uma tarde inteira andando por ruínas históricas e ruas de pedras imperfeitas e traiçoeiras do período pré-Colombo, no interior do Peru. Sua vontade é de apenas chegar ao hotel, tomar um banho e recarregar as energias para começar tudo de novo amanhã. O caminho mais rápido é chamar um táxi. Estatisticamente, as chances de você embarcar em um Daewoo Tico são grandes, bem grandes.

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O Daewoo Tico equipa boa parte da frota de táxi de Peru, Colômbia e Bolívia. Seu custo-benefício faz com que muitas corridas de táxi sejam mais em conta do que as viagens de Uber, 99 e afins, sobretudo no Peru e na Bolívia. Até hoje os serviços de aplicativo têm dificuldade de penetrar nestes mercados por causa do custo vantajoso das viagens com os mini Ticos.

Daewoo Tico
Congestionamento de Daweoo Tico é bem comum no Peru

A logística fácil – os portos do Peru e Colômbia ficam em linha reta com os portos asiáticos – e o desembaraço legal, uma vez que estes países sul-americanos não criaram barreiras de importação nem mesmo para usados, facilitaram a chegada dos pequenos coreanos, que desembarcaram aos montes no continente, já bem rodados.

Em 2010, só em Lima, capital do Peru, eram 63 mil Ticos rodando como táxis, quase o dobro da frota inteira de táxis de São Paulo, que era de cerca de 40 mil à época.

O mercado de manutenção e de customização de Ticos é bem forte. No Peru, é normal você encontrar veículos com modificações estéticas por dentro e por fora. Ainda assim, no geral, os carros são mal cuidados, alguns quase caindo aos pedaços, por causa da lei permissiva e da falta de fiscalização.

Daewoo Tico
Este Daewoo Tico já viu dias melhores, mas ainda vai rodar por um bom tempo

Tico: pequeno no nome e nos números

O Daewoo Tico foi produzido de 1991 a 2002, sobre a plataforma do Suzuki Alto de 1988. É um carro de dimensões bem enxutas: são 650 kg distribuídos em 3,34 m de comprimento, 1,4 m de largura e apenas 2,33 m de entre-eixos – menos do que o Renault Kwid.

O motor do coreano é um três cilindros de apenas 796 cilindradas, que o fazem ser extremamente econômico. Ainda assim, muitos donos sul-americanos instalaram pacotes GNV, combustível que é extremamente barato na Bolívia e no Peru.

Por aqui, a lei não permitiu a chegada do Tico. Primeiro, ele não se enquadrava na motorização mínima de 1.000 cilindradas. Além disso, no Brasil a importação de veículos usados é proibida desde 1991. A exceção vale para modelos com mais de 30 anos, comprados para coleção. O Congresso avalia mexer na lei e autorizar a importação de usados.

Ainda assim é possível encontrar Ticos sendo vendidos em solo nacional pela internet. Em uma rápida pesquisa, achamos um modelo por até R$ 25 mil.

Daewoo Tico
Encontramos Ticos sendo vendidos pela internet

Origem e fim da Daewoo

A coreana Daewoo foi fundada em 1967 por Kim Woo-Choong e, ao longo das décadas, foi conquistando vários mercados, como o de barcos, o de componentes eletrônicos e, claro, o de carros. Porém foi a diversificação que a levou a um endividamento, que acabou insustentável durante a crise financeira asiática do fim dos anos 1990.

Depois de declarar falência em 1999, a Daewoo foi dividida e vendida ao poucos. A General Motors comprou a divisão de automóveis e em 2002 a rebatizou como GM Daewoo. Em 2011 a coreana desapareceu por completo, quando sua última divisão foi vendida e o conglomerado passou a se chamar GM Korea.

O fundador Kim Woo-Choong foi processado e condenado em 2005 a 10 anos de prisão por fraude contábil e evasão de capitais. Morreu em 2019, a poucos dias de completar 83 anos.

Fim dos Ticos?

O envelhecimento da frota o faz ficar cada vez mais raro nas ruas da América do Sul. Antes da falência, a Daewoo tentou lançar seu substituto, o Matiz – precursor do Chevrolet Spark – que até vendeu bem na Europa, mas não conquistou o mercado sul-americano (no Brasil ele nem chegou). Nos nossos vizinhos, enquanto houver mecânico e funileiro de Tico, eles vão continuar rodando.

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Vicente Cassepp Borges
11 meses atrás

Sou proprietário de um Tico há 21 anos (único placa preta do Brasil) e adorei a reportagem. Parabens!

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