Em entrevista, ex-CEO da Nissan avalia marca perdida no cenário mundial. Veja as declarações

O ex-CEO da Nissan, Carlos Ghosn, disse em entrevista à TV francesa BFM Business que a situação da Nissan é desesperadora após uma série de decisões ruins. A declaração de Ghosn acontece após a Nissan tentar se afastar da Renault e se associar à Honda – o que acabou não dando certo (leia aqui).

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Primeiro: quem é Carlos Ghosn?

Carlos Ghosn é um executivo nascido no Brasil que nos anos 90 chegou ao posto de presidente da Renault. Ele costurou uma aliança que salvou a Nissan de uma falência iminente criando uma união entre Renault, Mitsubishi e Nissan. Acumulando o cargo de presidente da Nissan, ele acabou acusado de fraude na gestão da empresa. Ele nega esta acusação, mas acabou destituído tanto da Nissan como da Renault e preso no Japão. Carlos fugiu quando foi colocado em prisão domiciliar, em uma operação arriscada onde se escondeu em uma caixa e foi levado para o Líbano em um voo particular. Essa história é contada nos documentários The Last Flight (leia a resenha, atualmente está disponível na AppleTV) e CEO em fuga (Netflix).

A entrevista dada em maio ao canal francês está disponível no vídeo abaixo. Os principais pontos foram destacados por Turboway logo abaixo.

Sobre a situação atual da Nissan

“Essa situação era previsível desde 2020. Se você voltar a uma série de declarações que eu fiz, sobre o desaparecimento da aliança (com a Renault). Na verdade eu acho que o problema está no nível da gestão da empresa. A sinergia com a Renault diminuiu, desapareceu completamente. A marca foi enfraquecida na Europa. Na China ela assume custos que estão acima do praticado pelo mercado. O mercado não perdoa decisões lentas sobre produtos, sobre tecnologias e esta falta de cooperação com a Renault. E assim chegamos à situação desesperadora em que hoje está a empresa”.

O entrevistador pergunta se a marca Nissan poderia caminhar sozinha (sem a Renault) e relembra que a empresa chegou a negociar uma união com a Honda e a Foxconn também cogitou investir na empresa. Ele pergunta: Como a Nissan deveria se movimentar hoje?

“Essa pergunta é interessante porque se você se você voltar em 2019, se falava em uma nova aliança (com a Renault), em um novo relacionamento e todas estas bobagens. Mas o que vem acontecendo na verdade é uma separação das empresas, sem que isso seja assumido. E isso deixou a empresa sozinha, quando deveria aproveitar a aliança que existe com a Renault e a Mitsubishi, e indo buscar ajuda em sua concorrente no Japão (a Honda). Eu disse desde o início que a aliança com a Honda não aconteceria“.

O que Carlos Ghosn pensa sobre a atual fase da Renault?

Carlos foi um dos mais exitosos executivos da história da Renault. Atualmente a marca é comandada pelo sucessor dele, Luca de Meo, que realizou muitas mudanças na marca, priorizando produtos mais rentáveis. Carlos elogiou a gestão de Luca, mas faz ressalvas ao dizer que a marca regrediu de tamanho nos últimos anos.

“A Renault voltou ao que era antes de 1999, ou seja, um pequeno fabricante europeu bem gerido neste contexto, mas sem qualquer plano global ou presença mundial. Quando você vê os números de 2024 eles estão estáveis, não tem um resultado extraordinário. O plano de negócios da Renault em 2024 é menor do que o volume que teve em 2018. Estou falando dos lucros, considerando que os impostos estão mais baixos. A capitalização da empresa é metade do que era em 2017. Então se você olha os resultados neste contexto você diz que a equipe está fazendo um bom trabalho no contexto de uma pequena Renault”.

Xadrez mundial

Carlos foi perguntado sobre como uma fabricante deveria se comportar atualmente diante de desafios como o avanço dos chineses e as novas políticas de mercado de países como os Estados Unidos.

“O mercado mundial hoje é de quase 80 milhões de carros, sendo que 30 milhões são vendidos na China, 16 milhões nos Estados Unidos, seguido pela Europa. Então se você quer ser um fabricante relevante, você deve estar presente em pelo menos dois dos três principais mercados. E hoje o que você vê? A Renault está ausente na China e ausente nos Estados Unidos, o que é precário. Muitos fabricantes estão fazendo alianças porque agora ninguém vai muito longe sozinho. Mas estas alianças devem ter conteúdo, não podem ser apenas um anúncio verbal e devem ter rentabilidade. Quando eu olho para o que os chineses fazem, por exemplo o exemplo da BYD, que em 2007 não produzia um carro, e se especializou em veículos elétricos. Hoje eles vendem 4 milhões de carros e eles se valem da capitalização de mercado. O futuro é assim e o que se está fazendo para estimular este crescimento e a lucratividade? “

“Entendo que existe um acordo (da Renault) com a Geely, mas você sabe que é necessário analisar o que está no âmbito deste acordo. Por exemplo quando falávamos de aliança, havia muitas conexões entre as empresas (Renault e Nissan). Havia muita coisa em desenvolvimento e havia resultados com a sinergia entre as empresas e resultados para a Renault e para a Nissan. Mas se há um acordo superficial, que você troca de forma artificial alguns elementos, isso não leva a nada. Então a profundidade do acordo com a Geely será muito importante para a Renault, com certeza”.

Acusações

Carlos é acusado de usar indevidamente os ativos da Renault e da Nissan, cometer peculato, lavagem de dinheiro e desviar dinheiro destas empresas. Além de prisão decretada no Japão, ele também é procurado pela justiça da França. Ele explicou na entrevista que considera que foi submetido a um tribunal ‘medieval’ (palavras dele) no Japão, que não deu a chance para que ele se defendesse. Já na França a situação da prisão está relacionada com ele não ter se apresentado em um tribunal francês. Ele resume essa história assim:

“Quando eu cheguei ao Líbano, eu cheguei a ser intimado pelo Ministério Público da França, eles tem muitas perguntas, e então eles me intimaram para comparecer na França. Aí eu disse: espere, não posso ir para a Europa porque tenho um alerta vermelho do Japão para a Interpol. Ou seja, eu talvez sequer chegaria a entrar na França. Aí eles resolveram emitir mandado de prisão. Então o mandado de prisão é porque a justiça francesa não reconhece o fato de eu estar preso aqui no Líbano. Em segundo lugar, a investigação feita na França não é algo que tenho acesso, pois não consegui responder ao chamado do juiz que ignorou completamente o chamado do alerta vermelho japonês. É uma situação Kafkiana e hoje nem sei quais são as acusações que tenho no caso e isso já perdura por 5 anos”.

Perguntado se ele recorreu ao governo francês e ao brasileiro nestes anos para que intervissem diplomaticamente sobre sua situação, ele afirmou que foi ignorado pelo governo francês de Macron, e que também falou com o governo brasileiro, mas não obteve êxito.

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